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  • Foto do escritorTiago Oliveira Fernandes

Acórdão do T.C.A. Norte, proferido no âmbito do processo 02860/17.7BEPRT, datado de 24-03-2023

Analisa a responsabilidade da concessionária de uma autoestrada relativamente a danos causados por animais (javalis) que aí se introduziram.


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No caso concreto, verificou-se a existência de javalis numa auto-estrada, os quais determinaram danos numa viatura que aí circulava.



Ora,


De acordo com a Base XLV do Decreto-lei 189/2002, de 28 de Agosto, que Aprova as bases da concessão da concepção, projecto, construção, aumento do número de vias, financiamento, exploração e conservação de lanços de auto-estrada e conjuntos viários associados designada por concessão SCUT do Grande Porto, sob epígrafe “Manutenção da Auto-Estrada”,

1 - A Concessionária deverá manter a Auto-Estrada em bom estado de conservação e perfeitas condições de utilização, realizando os trabalhos necessários para que a mesma satisfaça cabal e permanentemente o fim a que se destina.

2 - A Concessionária é responsável pela manutenção, em bom estado de conservação e funcionamento, do equipamento de monitorização ambiental, dos dispositivos de conservação da natureza e dos sistemas de protecção contra o ruído.

3 - Constitui ainda responsabilidade da Concessionária a conservação e manutenção dos sistemas de contagem e classificação de tráfego, incluindo o respectivo centro de controlo, e ainda os sistemas de iluminação, de sinalização e de segurança nos troços das vias nacionais ou urbanas que contactam com os nós de ligação até os limites estabelecidos na base V.

4 - A Concessionária deverá respeitar os padrões de qualidade, designadamente para a regularidade e aderência do pavimento, conservação da sinalização e do equipamento de segurança e apoio aos utentes, fixados no Manual de Operação e Manutenção e no plano de controlo de qualidade.

5 - O estado de conservação e as condições de exploração da Auto-Estrada serão verificados pelo IEP de acordo com um plano de acções de fiscalização a definir pelo Concedente, competindo à Concessionária proceder, nos prazos que razoavelmente lhe forem fixados, às reparações e beneficiações necessárias à manutenção dos padrões de qualidade previstos no número anterior..”


Por sua vez, a Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, que Define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como auto-estradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares prevê o no seu art. 12.º sob epígrafe “Responsabilidade” que

“1 - Nas auto-estradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a:

a) Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem;

b) Atravessamento de animais;

c) Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais.”


Desta forma determinou assim o legislador uma presunção de incumprimento, de maneira a que será sobre a concessionária que recairá o ónus de provar que os factos ocorreram de forma incontrolável da sua parte, ou, bem assim, por culpa de terceiros.


De maneira a que, em caso de dúvidas na esfera julgador, e em cumprimento com as regras dos ónus da prova (cfr. art. 350.º do C.C.), sairá beneficiado o lesado pelo evento danoso.


Aliás, indo mais longe, já decidiu o Tribunal Constitucional nos Acórdãos n.ºs 595/2009 e 629/2009 que “na aceção segundo a qual em caso de acidente rodoviário em autoestradas, em razão do atravessamento de animais, o ónus de prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária e esta só afastará essa presunção se demonstrar que a intromissão do animal na via não lhe é, de todo, imputável, sendo atribuível a outrem, tendo de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral que não lhe deixou realizar o cumprimento”


No caso concreto, decidiu foi decidido através do aresto em causa que não conseguiu a R. provar a forma como os ditos javalis entraram na autoestrada, por forma a imputar a sua proveniência a terceiros ou a caracterizá-lo como sendo ou resultante de um caso fortuito, e que não podia ter adotado conduta diferente daquela que adotou, isto é, não logrou a R. provar factualidade de onde se possa concluir que cumpriu as exigências de diligência na sinalização e remoção dos obstáculos existentes na via, e, por conseguinte, não foi ilidida a presunção de incumprimento que sobre si impendia relativamente ao aludido dever de vigilância, não tendo resultado provados factos suficientes que permitam concluir que a mesma atuou com a diligência que lhe era exigida.”


De maneira a que decidiu pela responsabilidade da concessionária no ressarcimento dos danos causados por javalis que entraram na autoestrada.


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Sumário:

I- A Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, veio definir direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como autoestradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares.

II- A imposição de assegurar as condições de segurança em lanço rodoviário concessionado integra uma obrigação reforçada de meios.

III- Só o “caso de força maior devidamente verificado” exonera a concessionária da sua obrigação de garantir a circulação nas autoestradas em condições de segurança, pelo que, para afastar a presunção de culpa estabelecida no mencionado art. 12º,nº. 1, al. c) da Lei nº 24/2007, terá a concessionária de provar a ocorrência de um acontecimento concreto que integre o conceito de força maior, ou seja, de um “acontecimento imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária”.

IV- Não conseguindo a R. a forma como os ditos javalis entraram na autoestrada, por forma a imputar a sua proveniência a terceiros ou a caracterizá-lo como um eventual caso fortuito, e que não podia ter adotado conduta diferente daquela que adotou, isto é, não logrando a R. provar factualidade de onde se possa concluir que cumpriu as exigências de diligência na sinalização e remoção dos obstáculos existentes na via e, por conseguinte, não foi ilidida a presunção de incumprimento que sobre si impendia relativamente ao aludido dever de vigilância, não tendo resultado provados factos suficientes que permitam concluir que a mesma atuou com a diligência que lhe era exigida.* “




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