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Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 347/2025, proferido no âmbito do processo n.º 1042/2023, de 6 de maio de 2025

  • Foto do escritor: Tiago Oliveira Fernandes
    Tiago Oliveira Fernandes
  • 26 de mai.
  • 4 min de leitura

Aprecia a (in)constitucionalidade da alteração legislativa ao regime legal aplicável ao consumo de estupefacientes, operada pela Lei n.º 55/2023, de 08 de Setembro.

 

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Conforme preceitua o n.º 1 do art. 277.º da CRP, as normas que violem o disposto na Constituição ou os princípios nela consagrados são inconstitucionais.

 

A fiscalização das normas pode ser preventiva, i.e., antes de os diplomas serem publicados e entrarem em vigor, nos termos do disposto no art. 278.º da CRP, abstrata sucessiva, i.e., após publicadas e em vigor, independentemente da sua aplicação n caso concreto, conforme art. 281.º da CRP, ou concreta, i.e., no âmbito da aplicação de uma norma a um caso concreto por parte do Tribunal, conforme art. 280.º da CRP.

 

No caso concreto, foi requerido por um grupo de 23 deputados a AR, ao abrigo do disposto no artigo 281.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, alínea f), a fiscalização sucessiva das normas constantes dos n.ºs 3 e 4 do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, e dos n.ºs 2 e 3 do artigo 2º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, todos na redação introduzida, respetivamente, pelos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 55/2023, de 8 de setembro, que “Clarifica o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo independentemente da quantidade e estabelece prazos regulares para a atualização das normas regulamentares, alterando o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, e a Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro».

 

Recordamos que o referido normativo veio alterar o regime aplicável à detenção para consumo de estupefacientes, conforme texto acessível através do link https://www.tofadvogados.com/post/a-atualiza%C3%A7%C3%A3o-do-regime-legal-aplic%C3%A1vel-%C3%A0-deten%C3%A7%C3%A3o-de-drogas-para-consumo-lei-n-%C2%BA-55-2023-de-8-9 , alterando o paradigma em vigor até então.

 

Entendem os requerentes que o regime agora em vigor, e que revogou a dicotomia de crime / contra-ordenação da detenção para consumo consoante a quantia que fosse detida num concreto momento, viola o princípio da tipicidade, previsto no n.º 1 do art. 29.º da CRP, alegando para o efeito que “deixa de haver certeza sobre quando é que uma conduta – consubstanciada na aquisição e detenção de determinadas plantas, substâncias ou preparações em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual durante o período de dez dias – constituirá, ou não, crime de tráfico (…)”.

 

Ora,

 

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Conforme explicam os Juízes Conselheiros, o crime de tráfico encontra-se previsto, essencialmente, no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

Já o crime de consume encontrava-se previsto no n.º 2 do art. 40.º do referido Decreto-Lei, distinguindo-se do regime contra-ordenacional previsto na Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, em virtude das quantidades detidas.

Como tal, e quanto às condutas de consumo e tráfico, em face do tipo objetivo, claro estava que um excluía necessariamente do outro, sendo para o efeito irrelevante a quantidade detida, a qual funcionava como mero indício.

Aliás, como continua a ser, em termos genéricos.

 

Por outro lado, conforme consta do referido Acórdão, “entendeu o legislador que era necessária uma intervenção legislativa «no sentido de considerar toda a detenção/aquisição de estupefacientes descriminalizada, desde que se prove evidentemente que se destina a consumo pessoal (…). O limite quantitativo apenas poderá funcionar como mero indício de tráfico, devendo o Ministério Público remeter o processo à CDT, quando, sendo embora a quantidade superior, se indiciar uma situação de detenção para consumo ou, inversamente, o processo ser remetido pela CDT ao Ministério Público quando a quantidade for inferior, mas se concluir pela indiciação de tráfico”».

  

Como tal conclui o TC que “não se vê que a contraordenação «consumo» e o crime «tráfico» estejam previstos de uma forma tal, que não seja possível afirmar-se com toda a segurança, em relação à respetiva consagração, o respeito pela exigência de lei certa – e, diga-se, e de igual forma, o respeito pelo princípio in dubio pro reo, dimensão processual do princípio da presunção da inocência (artigo 32.º, n.º 2, da CRP)”.

 

E, consequentemente, o TC decidiu “não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 55/2023, de 8 de setembro (diploma que clarifica o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo independentemente da quantidade e estabelece prazos regulares para a atualização das normas regulamentares), na parte em que alteram, respetivamente, os n.os 3 e 4 do artigo 40.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na sua redação atual, e os n.os 2 e 3 do artigo 2.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, na sua redação atual.”

 

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Nota final:

Tal como havia sido exposto no texto publicado acessível através do link https://www.tofadvogados.com/post/a-atualiza%C3%A7%C3%A3o-do-regime-legal-aplic%C3%A1vel-%C3%A0-deten%C3%A7%C3%A3o-de-drogas-para-consumo-lei-n-%C2%BA-55-2023-de-8-9 existe a questão de uma tentativa de operar uma “inversão do ónus da prova” por parte do legislador.

 

Conforme evidenciam três Juízes Conselheiros na Declaração de Voto, “Nos termos do regime fiscalizado, a aquisição ou detenção das substâncias estupefacientes acima da quantidade necessária para consumo médio individual por 10 dias constitui um indício de que o propósito pode não ser o consumo (e, portanto, de que está preenchido aquele elemento do tipo legal do crime de tráfico), exigindo a demonstração positiva de que o único propósito é o autoconsumo (n.º 4 do artigo 40.º).”

 

Nessa sequência, concluem pela violação do princípio da presunção de inocência, consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição, em virtude de a proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido ser, reconhecidamente, a sua primeira e fundamental decorrência.

 

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Sumário:

(…) o Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 55/2023, de 8 de setembro (diploma que clarifica o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo independentemente da quantidade e estabelece prazos regulares para a atualização das normas regulamentares), na parte em que alteram, respetivamente, os n.os 3 e 4 do artigo 40.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na sua redação atual, e os n.os 2 e 3 do artigo 2.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, na sua redação atual..




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