Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes da alínea b) do artigo 4.º e da segunda parte do artigo 21.º, ambas da Lei n.º 45/2012, de 29 de agosto (regime jurídico de acesso e exercício da profissão de examinador de condução e o reconhecimento das entidades formadoras).
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O regime jurídico de acesso e exercício da profissão de examinador de condução e o reconhecimento das entidades formadoras foi aprovado pela da Lei n.º 45/2012, de 29 de agosto.
De acordo com a al.b) do art. 4.º da referida Lei, sob epígrafe “Idoneidade”, “Não pode ser examinador de condução quem (…) Tenha sido condenado, por sentença transitada em julgado, por crime praticado no exercício da profissão de examinador.”
Este artigo releva, essencialmente, para efeitos de acesso ao curso de formação inicial de examinador de condução, sendo que, de acordo com o art. 5.º da referida Lei, um dos pressupostos para o efeito é possuir idoneidade, nos termos do artigo 4.º, sendo este requisito de verificação permanente no exercício da profissão de examinador, de acordo com o seu n.º 2.
Já o art. 21.º da referida Lei determina que “A credencial de examinador de condução é cancelada ao examinador que seja interdito para a atividade da realização de exames de condução ou condenado por crime praticado no exercício da profissão de examinador, por sentença transitada em julgado”.
Ora,
No caso concreto, a Provedora da Justiça concluiu a sua argumentação, além do mais, nos seguintes termos:
“A diversidade dos tipos de crimes que cabem na ampla formulação legal; a diversidade de situações da vida que nessa formulação se podem subsumir; a impossibilidade de, perante tais situações, poder ajuizar-se das particularidades dos casos concretos e do merecimento que neles venha a ter a consequência gravosa da perda do direito a exercer a profissão; o facto de tal perda ser, além de aplicação automática, definitiva, visto que nenhum limite temporal à sua vigência se prevê - tudo isto leva a crer que, in casu, não estaremos perante situação análoga a outras, em que o Tribunal entendeu que, por haver uma ligação «consistente e convincente» entre o efeito necessário e o crime praticado, podia o legislador estabelecer efeitos jurídicos automáticos decorrentes da condenação penal”, e que, considerando as liberdades fundamentais de escolha de profissão, consagrada no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição, e o direito ao trabalho, na sua vertente negativa, como direito a ganhar a vida por intermédio do emprego que se escolheu e obteve (vide artigo 58.º, n.º 1), atento o disposto no n.º 2 do art. 18.º da CRP, o “limite de proporcionalidade (nas restrições aos direitos) é, in casu, largamente ultrapassado. Nem a salvaguarda do interesse público na segurança rodoviária exige, como medida necessária, que o examinador de condução seja definitivamente arredado do exercício da sua profissão pelo efeito automático da condenação penal, nem tão pouco se demonstra que haja algum equilíbrio ou equivalência entre a intensidade da restrição à liberdade que por intermédio desse afastamento se introduz na ordem jurídica e o ganho de bem comum que com essa restrição se obtém.”
Analisada a situação, entendeu o Tribunal Constitucional que “a consequência jurídica prevista no artigo 21.º, da Lei n.º 45/2012 constitui uma perda de direitos profissionais, para efeitos da aplicação do artigo 30.º, n.º 4, da Constituição; bem assim, a situação prevista no artigo 4.º, n.º 1 alínea b) do mesmo diploma, enquanto limite ao acesso à profissão de examinador de condução, ambos consubstanciados na liberdade de escolher e de exercer a atividade de examinador de condução (artigo 47.º, n.º 1, da Constituição).”
Estando tal facto assente, considerando a automaticidade da perda de direitos profissionais previsto nos respetivos preceitos legais, releva o regime previsto na Lei n.º 37/2015, de 5 de maio (Lei da identificação criminal), de acordo com a qual é possível obter a não transcrição da condenação para efeitos laborais (artigo 10.º, n.º 5 e artigo 13.º), po cancelamento definitivo (artigo 11.º), e cancelamento provisório do registo criminal (artigo 12.º).
Não obstante, entendem os Juízes Conselheiros que “a fórmula seguida pelo legislador no caso em apreço, delimitando a previsão das normas a um crime praticado no exercício da profissão de examinador de condução, é, pela sua vagueza, e consequente indeterminabilidade, inapta a estabelecer, em abstrato, uma conexão relevante com a restrição dos direitos profissionais em causa, ao associar a proibição de - voltar ou continuar a - exercer a profissão de examinador de condução à condenação pela prática de um qualquer tipo de crime praticado no exercício desta profissão”.
Assim, a falta de objetividade e concretização do legislador espelhadas nos normativos em consideração, com a expressão “crime praticado no exercício da profissão de examinador de condução“ leva a que não seja possível descortinar a conexão entre o tipo concreto de crime e o seu efeito restritivo .
Conclui o referido aresto relevando que “a incerteza sobre o quadro de interesses que se pretender tutelar com as normas sob apreciação, consequência da ausência de um exame ponderativo plasmado nas normas em apreço, representam uma inultrapassável objeção à realização do juízo que permite afirmar a ausência da automaticidade dos efeitos restritivos proibida pelo artigo 30.º, n.º 4, da Constituição” e, desta forma, declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas constantes da alínea b) do artigo 4.º e da segunda parte do artigo 21.º, ambas da Lei n.º 45/2012, de 29 de agosto, por violação do disposto no n.º 4 do artigo 30.º da Constituição da República Portuguesa.
Sumário:
“Declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas constantes da alínea b) do artigo 4.º e da segunda parte do artigo 21.º, ambas da Lei n.º 45/2012, de 29 de agosto, por violação do disposto no n.º 4 do artigo 30.º da Constituição da República Portuguesa.”
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