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  • Foto do escritorTiago Oliveira Fernandes

Acórdão do S.T.Justiça., proferido no âmbito do processo 4184/21.6T8FNC.L1.S1, datado de 17/10/2023

Analisa a aplicação da regra de comunicabilidade do contrato de arrendamento ao cônjuge celebrado anteriormente à entrada em vigor do NRAU, bem como a relevância do regime e data de casamento celebrado para o efeito.


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Como consabido, em 27 de junho de 2006 entrou em vigor o NRAU (Novo Regime de Arrendamento Urbano), o qual determinou um conjunto de alterações profundas na legislação do arrendamento em Portugal.


No que diz respeito à comunicabilidade do arrendamento, o regime legal que vigorava anteriormente à entrada em vigor do NRAU vinha previsto no então art. 1110.º do Código Civil e, posteriormente, no art. 83.º do R.A.U. (Regime do Arrendamento Urbano (Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro).


Assim, previa o n.º 1 do art. 83.º do R.A.U. que

“Seja qual for o regime matrimonial, a posição do arrendatário não se comunica ao cônjuge e caduca por morte, sem prejuízo do disposto nos dois artigos seguintes”, referindo-se o art. 84.º do RAU à Transmissão por divórcio e o art. 85.º do RAU à Transmissão por morte.

Assim, e em termos sucintos, no que diz respeito à situação relacionada com o matrimónio,

a) no caso de divórcio, determinava o n.º 1 do art. 84.º do RAU que “Obtido o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens, podem os cônjuges acordar em que a posição de arrendatário fique pertencendo a qualquer deles”, e

b) no caso de morte, determinava a al. a) do n.º 1 do art. 85.º e 86.º, ambos do RAU, que “O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário ou daquele a quem tiver sido cedida a sua posição contratual, se lhe sobreviver [c]ônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens ou de facto [, salvo] se o titular desse direito tiver residência nas comarcas de Lisboa e Porto e suas limítrofes, ou na respectiva localidade quanto ao resto do País, à data da morte do primitivo arrendatário”.


Ora,


Com a entrada em vigor do NRAU, passou a prever o art. 1068.º do Código Civil que “O direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente.”


Quanto à aplicação do NRAU aos contratos em vigor à data da entrada em vigor, o legislador estipulou no n.º 1 do art. 59.º que “O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”.


Sendo certo que não existe qualquer norma transitória que obste a aplicação da regra da comunicabilidade dos contratos de arrendamentos aos cônjuges.


Como tal, e conforme consta do referido aresto, este “novo” artigo 1068.º do Código Civil “(…)tutela os interesses duma generalidade de pessoas (os cônjuges dos arrendatários) que se achem ou possam vir a achar ligadas por uma certa relação jurídica, de modo a poder dizer-se que tal disposição atinge essas pessoas/cônjuges, não enquanto contraentes, mas enquanto pessoas ligadas (por intermédio do seu cônjuge) a um certo tipo de vínculo contratual (no caso, o arrendamento”.


Assim, passou a vigorar a regra segundo a qual ocorre a comunicabilidade do contrato de arrendamento ao cônjuge, salvo no caso de o regime de casamento ser o de separação de bens, porquanto o art. 1735.º do C.C. determina que “Se o regime de bens imposto por lei ou adoptado pelos esposados for o da separação, cada um deles conserva o domínio e fruição de todos os seus bens presentes e futuros, podendo dispor deles livremente”, e salvo o arrendamento tenha iniciado em momento anterior ao casamento celebrado segundo o regime de comunhão de adquiridos


Conforme explicam os Venerandos Juízes Desembargadores no Acórdão em apreço,

“A partir de 27 de junho de 2006, com a entrada em vigor do NRAU, faz parte do estatuto jurídico do cônjuge (não casado no regime da separação de bens) do arrendatário a comunicação da qualidade de arrendatário (pois que este é o efeito da comunicação do direito ao arrendamento ao cônjuge): por força do art.º 1068, dá-se a conversão de um contrato de arrendamento que, quanto ao arrendatário, era singular num contrato de arrendamento plural”.


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Sumário:

I – O art. 1068.º do C. Civil na redação dada pela Lei 6/2006 (NRAU) – que estabelece a comunicabilidade do arrendamento – é de aplicação imediata às relações jurídicas (situações jurídicas) constituídas antes da sua entrada em vigor, mas subsistentes ou em curso à data do seu início de vigência.

II – Significa a remissão final do art. 1068.º do C. Civil para o “regime de bens vigentes” que, no regime de separação de bens, não há comunicabilidade; e que, no regime da comunhão de adquiridos, há comunicabilidade se a posição jurídica de arrendatário do cônjuge se iniciar em data posterior à celebração do casamento.




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